MARTIN HEIDEGGER, A M�SCARA DO SER |
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Que fazer com o Ser? Em "Ser e Tempo", Martin Heidegger coloca a quest�o radical acerca do ser, quest�o essa que atravessa horizontalmente toda a hist�ria da filosofia. Porqu� colocar a quest�o acerca do ser? N�o ter� o Homem outro tipo de preocupa��es priorit�rias que o leve a questionar-se, tal como a quest�o pelo sentido da sua exist�ncia, o problema do mal que grassa em todos os dom�nios da vida humana e da infelicidade da� resultante? Todos n�s, temos consci�ncia da urg�ncia e da exig�ncia deste tipo de questionamento, apesar de podermos objectar de, na maioria das vezes, n�o possuirmos a lucidez e a capacidade de encontrar uma resposta satisfat�ria que sacie esse desejo incontorn�vel pelo saber que acompanha a vida de todo e qualquer ser humano. Poderemos, sem qualquer tipo de hesita��o afirmar o mesmo relativamente � quest�o acerca do ser? S�rias dificuldades se levantam no nosso esp�rito. Assim sendo, o que fazer com o ser? Ningu�m ter� d�vidas acerca da futilidade desta quest�o, que obrigou o Homem, desde tempos imemoriais a brincar aos fil�sofos, situa��o elogiosa e aceit�vel h� alguns s�culos, mas claramente fora de moda nas sociedades utilitaristas da actualidade, onde o lucro e a necessidade de obter respostas objectivas e pr�ticas n�o permite que nos detenhamos com semelhantes frivolidades. N�o ser� necess�rio negar ao ser qualquer tipo de estatuto e import�ncia, convenhamos, um bom pre�o a pagar pelas longas horas que o Homem dedicou, sem qualquer resultado, a indagar a sua natureza? Ningu�m, de bom senso, ter� d�vidas acerca disso. |
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O penoso,
nesta denega��o do ser que pretendemos levar a cabo, � a contradi��o imediata do seu
sentido. Pois o ser, que n�o queremos questionar nem ouvir falar, tomou j� a palavra na
nossa pr�pria palavra. Quando procuramos negar a quest�o acerca do ser, estamos j� a
afirmar o pr�prio ser. Para negar o direito � quest�o por parte do ser, ser�
necess�rio justificar o porqu� dessa nega��o, dizendo o que este ser �
- que ele � absurdo, que n�o �
nada, que n�o � um verdadeiro ente. Resumindo, ser�
necess�rio cometer a contradi��o que Pascal observou: para refutar o ser, � preciso
definir o ser, no entanto, para defini-lo, � j� necess�rio dizer que ele �, ou seja,
� j� ter em considera��o o pr�prio ser. A quest�o do ser coloca-se ela mesma, quer o
queiramos ou n�o. O ser � e est� sempre a�. � pois, necess�rio dizer algo acerca do ser. Este � o ponto de partida que serve de apoio e que Heidegger encontra para iniciar a sua obra de 1927, "Ser e Tempo". � a impossibilidade real de contornarmos o pr�prio ser, que nos leva a enfrent�-lo e a question�-lo, num �ngulo totalmente distinto do habitual, pois segundo Heidegger a quest�o do ser foi incorrectamente abordada pela tradi��o filos�fica ocidental. "Porque � que existe o ser e n�o o nada?", interrogava-se Leibniz, substitu�do tr�s s�culos mais tarde por Heidegger. Quest�o primeira e fundamental que o fil�sofo ir� procurar trabalhar tal como o poeta trabalha a sua l�ngua. Toda e qualquer explica��o que poder�amos avan�ar acerca desta mat�ria, deixaria supor que n�s admitimos a exist�ncia de qualquer coisa, que Heidegger designa por ente - pois como conceber que n�o existe rigorosamente nada. No entanto, esta quest�o, banal e simples n�o pode ser solucionada facilmente. Ela � fundamental, pois leva-nos a regressar ao fundamento das coisas e coloca-nos numa situa��o deveras filos�fica, aquela do espanto perante o mundo."Porque � que o ente est� arrancado � possibilidade do n�o-ser? Porque � que ele n�o volta ao n�o-ser? Porque � que o ente �? Com este tipo de quest�es, colocamo-nos no ente de tal modo que ele acaba por perder toda a sua evid�ncia e banalidade enquanto ente". Heidegger pretende restaurar a efic�cia de uma quest�o que segundo ele n�o foi posta de uma forma expl�cita desde a filosofia cl�ssica de Plat�o e Arist�teles. H� uma necessidade de repeti��o expl�cita da quest�o do ser. � necess�rio restaurar uma quest�o esquecida. Segundo ele, a metaf�sica ocidental � a hist�ria do esquecimento do ser, que pergunta pelo ser a partir de um ponto j� determinado acerca do sentido desse ser, sentido esse que n�o � posto em causa. A metaf�sica move-se j� numa estrutura, num enquadramento ontol�gico e n�o consegue remontar esse enquadramento ontol�gico. O ser � o mais geral e o mais vazio dos conceitos, da� a falha e o esquecimento por parte da filosofia. Ainda hoje, quem pergunta pelo ser � acusado de cometer um erro metodol�gico ou categorial. Heidegger ir� apresentar tr�s preconceitos que fizeram com que a quest�o do ser n�o fosse considerada uma quest�o e que estiveram na origem do esquecimento do ser. O primeiro preconceito radica na afirma��o de que o ser � o conceito mais geral de todos os conceitos. Por ser t�o geral, parece nada dizer acerca das coisas. O pr�prio Arist�teles afirmava que o ser se diz de muitas formas, tem v�rios sentidos e esses sentidos s�o anal�gicos, n�o t�m nada de comum entre eles. Heidegger afirma que n�o existe qualquer avan�o na quest�o do ser entre o pensamento de Arist�teles e Hegel. Hegel diz que o ser � o indeterminado imediato. Imediato porque ele se d� na imediatidade, o "indeterminado" pretende significar a universalidade do conceito ser. O segundo preconceito passa pela afirma��o de que o ser � indefin�vel. Segundo Pascal � imposs�vel definir o ser, isto porque para defini-lo temos de dizer que o ser � branco, � preto, � determinado, � indeterminado, etc..., ora isso pressup�e um conhecimento pr�vio acerca daquilo que o ser �. Heidegger critica esse esvaziamento do conceito do ser levado a cabo pela metaf�sica desde Parm�nides (o ser �, o n�o-ser n�o �). O ser foi entendido como um objecto, como algo de dispon�vel, fixo, como um objecto fixo do pensamento. Arist�teles atribui ao ser uma estrutura predicativa e ser� essa divis�o entre g�neros e esp�cies que ir� influenciar decisivamente o pensamento ocidental. � todo este discurso acerca do ser que Heidegger ir� contestar. Isto porque a predica��o, o �, fica sempre por questionar, e nesta pequena vogal encontramos todo o destino da metaf�sica ocidental que nos levou ao esquecimento do ser. Heidegger, recusando a estrutura proposicional do ser, vai questionar o sentido do ser. � o sentido do ser que nos interessa e n�o propriamente a sua defini��o. quando se pergunta pelo sentido deixamos obviamente de perguntar pela defini��o e � neste pequeno pormenor que ir� surgir a diferen�a entre o ser e o ente (diferen�a ontol�gica). O terceiro preconceito fundamenta-se na ideia de que o ser � um conceito �bvio. Nesta banalidade do ser esconde-se um enigma, um mist�rio. Esta concep��o que considera o ser como algo de �bvio, deve ser destru�da, pois n�o passa de um equ�voco que nos impede de questionar radicalmente o ser. A originalidade heideggeriana, consistir� na passagem de uma estrutura apof�ntica, predicativa, isto �, o ser �..., para uma estrutura hermen�utica do ser. Da� a afirma��o da exist�ncia de uma pr�-compreens�o do ser. N�s, antes de definirmos o ser, de dizer que ele � branco ou preto, possu�mos j� uma pr�-compreens�o do ser. Esta � a estrutura de sentido pr�via. H� uma ideia de abertura de sentido que � anterior a qualquer tipo de predica��o, isto �, entendemos previamente o ser, sem termos a necessidade de o inserir numa qualquer estrutura predicativa, num qualquer ju�zo. � essa abertura origin�ria que corresponde ao sentido de verdade. Uma via de acesso ao ser acaba por se fechar definitivamente: o ser, jamais poder� ser pensado a partir do ente e ainda menos a partir do seu conceito. Heidegger tematisou este princ�pio com o termo da "diferen�a ontol�gica". Resta-nos portanto, a tentativa de pensarmos o ser separado do ente, seguindo um processo oposto �quele da metaf�sica, que acreditou desde sempre poder atingir o ser, fixando o ente supremo que se ofereceria como o mais elevado exemplar (segundo a sua "constitui��o onto-teo-l�gica"). Alcan�ar o ser por si s�, por uma via directa? Heidegger ele pr�prio n�o conseguiu. Por duas vezes teve que renunciar. Inicialmente em "Ser e Tempo" (1927), onde ele ainda se apoia num ser privilegiado, o ser-a� (Dasein), que, evidentemente, n�o consegue atingir o ser enquanto tal. O dasein � um ente, n�o um ente semelhante aos demais, mas um ente que procura compreender o seu pr�prio ser e a ele se refere. Neste sentido, a compreens�o do ser � uma determina��o ontol�gica do dasein, este aparece n�o s� como um ser �ntico mas tamb�m como ontol�gico. O dasein (o ser-a�, a "exist�ncia", a "realidade humana", "o estar a�") � proeminente sobre os demais entes porque no decurso da sua compreens�o, enquanto compreens�o ontol�gica, se abre � realidade do ser. Em vez de partirmos de uma qualquer ideia do ser e aplic�-la automaticamente ao dasein, h� que partir de uma anal�tica existencial por meio da qual se ir� preparar o terreno para a compreens�o do ser em geral. No entanto, devemos n�o somente evitar partir de uma suposta compreens�o do ser em geral, mas simultaneamente de qualquer uma das ideias acerca do ser postas em circula��o pela filosofia. Estas ideias apenas "recobriram" o ser. � pois essencial proceder a uma "destrui��o da ontologia", isto �, a uma dissolu��o das camadas encobridoras, endurecidas ao longo da hist�ria do pensamento filos�fico. Da� que Heidegger considere que o seu ponto de partida � um ponto de partida verdadeiramente radical - mais radical que o do Cogito (veja-se Cogito, Ergo Sum) e mais radical que toda a "consci�ncia transcendental", seja a kantiana ou a husserliana. Seguidamente, em "Tempo e Ser" (1962), onde o ser se encontra (tal como o tempo) submetido a uma nova inst�ncia - o acontecer - onde, de uma forma n�o dissimulada, ele desaparece. Assim, a reformula��o radical da quest�o do ser, repetia as aporias em que desembocavam as investiga��es metaf�sicas acerca do ser e do ente. Ser� necess�rio concluir o que Arist�teles anunciava acerca do ser: "...actualmente e desde sempre investigado...", no entanto, "nunca alcan�ado"? Fa�amos uma experi�ncia. Este peda�o de giz branco que tenho na minha m�o � algo com uma forma e um comprimento determinado e com uma certa cor. No entanto, ele poderia ser azul e ainda mais comprindo. Poderia igualmente n�o se encontrar na minha m�o neste momento. Poderia at� n�o existir de todo. � esta possibilidade que "coloca o ente no seu vacilamento entre ser e n�o-ser". Deste modo, o giz, tal como todo e qualquer ente, deve o seu ser ao pr�prio ser. "O ente e o seu pr�prio ser, ser� a mesma coisa? O que � o ente, por exemplo, neste peda�o de giz? O ente significa primeiramente o que � ente, em cada caso; aqui esta massa de um cinzento branqueado, de uma forma determinada, ligeira, fria. Por outro lado, podemos facilmente compreender que aquilo de que acab�mos de falar pode tamb�m n�o-ser, pois afinal de contas este giz n�o tem necessariamente que ser, nem ser em geral. Em que consiste portanto, a diferen�a entre aquilo que pode manter-se no seu ser e o que a qualquer momento pode vacilar para o n�o-ser, onde reside a diferen�a do ente para com o ser?". "Nem sobre o ente, nem no ente, nem em qualquer outro lugar, jamais poderemos aprisionar o ser do ente directamente. Ent�o, onde se esconde o ser? � necess�rio que alguma coisa desse g�nero perten�a ao giz, pois ele mesmo, �". H� pois uma distin��o fundamental entre o ente enquanto algo que �, dotado de um conjunto de determina��es, e aquilo que acontece a esse ente, o evento que lhe diz respeito: o facto de ele estar precisamente a ser. � pois, um acontecimento que a coisa vive, apesar de este acontecimento n�o nos marcar imediatamente. � precisamente aqui que reside a grande dificuldade. O ser enquanto processo em obra no seio das coisas est� dissimulado na presen�a imposta das coisas mesmas. Deste modo, tamb�m podemos afirmar que o ser � um "dom" de todas as coisas, mas um dom que apenas se d� no seu dar, e que ao dar-se deste modo, se ret�m e se substrai". Contexto
hist�rico do pensamento heideggeriano
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